terça-feira, dezembro 05, 2006

3:40 AM

Rodo a chave no canhão da porta com um movimento lento para não fazer barulho. Abro a porta a medo, já com receio do ranger que anda a fazer há algum tempo e que ainda não tive paciência de tratar. O barulho da porta a chiar põe-me chateado comigo mesmo. Entro. Pouso o chapéu-de-chuva. Passo pela sala, agora transformada num escritório em ponto grande, deixo a mochila com o portátil e o casaco, dirijo-me ao quarto. A porta está entreaberta. Espreito. O Miguel dorme algures debaixo do edredão, completamente tapado. Não admira, com o frio que tem estado, e nesta casa, tão perto da foz do Tejo, a humidade é enorme, o que é bom para a minha sinusite mas péssimo para o conforto térmico! Começo a despir-me com rapidez pois o frio aperta, visto o pijama quentinho, de flanela, que o meu amor deixou carinhosamente em cima do antigo aquecedor a óleo que pouco mais faz do que aquecer o que tiver em cima dele, de resto já deu o que tinha a dar. Saio novamente para ir lavar os dentes e passar a cara por água. “Que pena que estejas a dormir...”. Há tanto que lhe queria dizer... Afinal, quando não tinha ninguém estava fechado em mim, num espaço incógnito, sem poder falar sobre mim e da minha vida com ninguém, e agora só me parece uma enorme injustiça não ter um horário para lhe contar tudo o que acumulei o dia inteiro. Lembrei-me que tenho que enviar um ficheiro ao Zeca lá do laboratório e que tenho no PC aqui de casa. Passo pela sala para cumprir o prometido. No quarto ao lado, a pessoa que mais gosto no mundo dorme profundamente... sozinho. Vejo pasta atrás de pasta à procura do ficheiro pretendido. Com este trabalho todo não tenho tempo para nada mas este disco bem precisa de uma reorganização... “Ah, aqui está!” Escrevo qualquer coisa e adiciono o ficheiro como anexo. “Plim!”, um sinal sonoro do PC faz-me tremer. Espero não ter acordado o Miguel, aquele meu boneco lindo. «47 Messages Received» Mesmo quase a ir para a cama e nem o PC de casa me deixa em paz com a quantidade de e-mails que tenho para ler. Passo uma vista de olhos pelo Thunderbird. “Sorte!” Não há nenhum mail marcado como ‘Importante’. Amanhã vejo isto. É agora que vou para a cama. Não... Esqueci-me que tenho a minha medicação. Passo pela cozinha. Lá está na banca a caneca de leite que o Miguel toma religiosamente antes de ir para a cama. Ponho-a, como sempre, na máquina de lavar. Já desisti de lhe pedir isso porque ele com o sono nunca se lembra. Tomo os comprimidos com água abundante. Vou para o quarto. Vejo as armas do Aikidô encostadas à parede. “Que raiva! Tenho que fazer o saco.” O que me vale é que o Miguel quando chega a casa depois do trabalho põe-me o Kimono a lavar, e depois na máquina de secar, e a seguir passa-mo e coloca-o direitinho, dobradinho, para que eu lhe diga sempre que ele é um querido... coisa que digo sempre! :) “Tolha, champô, cinto, chinelos, roupa interior... está tudo.” Não fecho o fecho para não o acordar. Levanto os lençóis e tento meter-me dentro da cama, o que é bastante mais fácil agora que temos a nossa cama de casal, nesta casa nova. Quando vivia com o R. e a N. era o cabo dos trabalhos para dormirmos juntos na cama de solteiro que tinha, e em casa dele também não era muito diferente, mas agora até tenho espaço para entrar na cama sem o acordar. Entrei. Ele vira-se na minha direcção, abraça-me com os olhos semicerrados. “Não te queria acordar boneco”, disse-lhe em voz baixinha, sussurrada. Chega-se para mais perto de mim e encosta a cabeça dele à minha. Como sempre sem sequer se vai lembrar disto amanhã, faz imenso disto, até chega a falar em certos dias, mas no dia seguinte não se lembra de nada. Farto-me de gozar com ele sobre isso. Costumo dizer-lhe que sei tudo sobre ele porque o interrogo à noite e ele diz-me a verdade toda. Enfim, são daquelas brincadeirinhas de casal que dão cor à relação. Sinto a respiração dele na minha pele. É tão bom estar aqui assim, cercado pelos braços de quem me ama todos os dias, de quem acorda apaixonado por mim todos os dias, de quem se preocupa comigo todos os dias, de quem está sempre disponível para mim todos os dias, a todas as horas, à distância de um telefonema, de quem retribui o meu amor e a minha dedicação todos os dias. Sinto-me seguro. Em casa. Em nossa casa. Sinto-me cansado agora, as horas tardias e o dia em frente de computadores e livros, e em reuniões, fazem destas coisas. Encolho-me mais debaixo dos lençóis, aconchegado pelo abraço do Miguel e perco-me em pensamentos para o nosso futuro. O Miguel tem tantos sonhos e ambições... e eu também tenho os meus... haveremos de os cumprir a todos... [adormeço]

1 Comments:

Blogger pipanuttree said...

Não sei muito bem como é que cheguei ao teu blog, acho que foi por link de outro blog. Tens textos lindos :) gostei muito, acho que o vou visitar mais vezes!

abril 13, 2007 12:57 da tarde  

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